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domingo, 6 de novembro de 2011

Venda de bebida alcoólica e a Lei Estadual 14.592, de 19 de outubro de 2011

Lei do Estado de São Paulo nº 14.592, de 19 de outubro de 2011
    
 Introdução
      Com a preocupação do poder executivo bandeirante com o consumo de bebidas alcoólicas por menores de dezoito anos, surgiu a Lei nº 14.592/11 que também proibiu o acesso de menores a bebida alcoólica. A proibição não é nova , pois sempre constou do ordenamento jurídico.  Verifique-se   no art. 63 da LCP e no próprio art. 81, II do ECA.
      A novidade de tal lei paulista foi a incrementar a multa, indexando-a (ao contrário das recentes infrações do ECA que foram fixadas em reais) e estabelecer condutas dos estabelecimentos comerciais para evitar o acesso de crianças e adolescentes às bebidas alcoólicas. O fato de se lamentar é a falta de técnica da conduta típica administrativa sancionadora. Poder-se-ia ter fabricado tipos administrativos à semelhança dos tipos penais para melhor adequação da conduta ilícita administrativa do autuado. Também faltou técnica ao artigo 3º, parágrafo único que menciona que as sanções poderão ser aplicadas por medida cautelar. Uma coisa é se falar em sanção a ser aplicada pela autoridade administrativa. Outra coisa é a imposição de medida cautelar. Na prática podem ser iguais, mas possuem conteúdo técnico diferenciado. Trata-se de garantias semelhantes às penais e processuais penais que incidam no atual garantismo penal e processual penal.
     
      O crime do art. 243 do ECA

     O tipo penal em comento da lei menorista sempre teve apoio majoritário da jurisprudência na atipicidade da conduta de fornecimento de bebida alcoólica ao menor de 18 (dezoito) anos de idade (STJ, REsp 331.794-RS. Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 25-2-2003, REsp 942.288 – RS, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 28-2-2008; TJMS, Processo: 2010.006409-8, j. 23-3-2010). Em sentido contrário. O artigo 2º da lei estadual fez referência expressa ao artigo 243 do ECA, entendendo que tal conduta amolda a esse tipo e não à contravenção do artigo 63, inciso I da LCP.
    
    Infrações de natureza, grave, média e leve

      Grau de reprovabilidade das infrações. Seguindo a costumeira técnica do direito administrativo sancionador, previu a referida Lei estadual a divisão entre infrações de natureza grave, média e leve. Indubitavelmente a rotulação se vincula à gravidade da conduta cometida pelo infrator. São comentadas aqui as infrações de acordo com o seu amoldamento, seguindo-se a técnica do tipo do direito penal visando facilitar o entendimento do que constitui a conduta delituosa administrativa.
     Infrações de natureza grave. São as capituladas no artigo 1º e seu parágrafo único e no artigo 2º, inciso III (art. 4º, inciso III). A conduta estipulada no art. 1º consiste em vender, ofertar, fornecer, entregar e permitir o consumo de bebida alcoólica ainda que gratuitamente, aos menores de 18 (dezoito) anos de idade. Já a conduta do seu parágrafo único consiste em ofertar bebida alcoólica como premiação aos menores de 18 (dezoito) anos de idade em quermesses, clubes sociais, instituições filantrópicas, casas de espetáculos, feiras, eventos ou qualquer manifestação pública. Nesse caso, a tipificação foi pensada para inibir a entrega de “prêmios” em sorteios p. ex. de feiras, comícios, bingos de igreja etc. A criança ou adolescente ganharia como prêmio uma “caixa de cerveja”. Pode ser que serviria ao pai, mas sem dúvida nenhuma induziria ou instigaria o consumo. A conduta tipificada no artigo 2º, inciso III prevê a conduta omissiva própria de permitir o consumo de bebidas alcoólicas nas dependências do estabelecimento comercial. Finalmente existem as condutas ilícitas dos parágrafos 3º e 4º do art. 2º. O § 3º pune o infrator ou responsável que “deixar de exigir documento oficial de identidade, a fim de comprovar a maioridade do interessado em consumir bebida alcoólica e, em caso de recusa, fornecer o produto.” O legislador ordenou que o empresário ou seu empregado exija a exibição do documento de identificação, seja lá que idade tiver o consumidor. Se este se recusar, deverá não comercializar o produto. Trata-se tipicamente de ilícito administrativo de perigo abstrato, dispensando inclusive a inexistência de lesão ao bem jurídico tutelado que é a integridade psíquica, física, moral e espiritual da criança e do adolescente. Mesmo sendo um senhor de sessenta anos de idade que vá ao supermercado, deve o comerciante exigir a identificação e no caso de recusa, não vender o produto. Tecnicamente trata-se de uma conduta que possivelmente não será punida. Uma pela impossibilidade física do empregado de exigir de todos a identificação. E duas, pela conhecida falta de fiscalização dos agentes públicos. Já o parágrafo 4º pune o empresário, responsável, empregado ou preposto que deixe comprovar, quando solicitado, a idade dos consumidores que estejam fazendo uso de bebidas alcoólicas nas suas dependências. A conduta típica objetiva consiste em permitir que qualquer pessoa consuma bebida alcoólica e adentrando um fiscal no estabelecimento e indagando sobre a idade de determinada pessoa, o empregado ou responsável não consiga comprovar a idade deste. Exemplo: o indivíduo não trouxe sua carteira de identidade.
    Sanções administrativas: Multa. É a sanção pecuniária. O art. 4º da referida Lei estipula o valor mínimo de 100 (cem) e máximo de 5.000 (cinco mil) unidades fiscais do Estado de São Paulo – UFESPs para todas as infrações cometidas: graves, médias e leves.
     Essa é aplicada em dobro na hipótese de reincidência. O conceito de reincidência da infração administrativa respeito o conceito de trânsito em julgado administrativo porque exige a infração e que a penalidade tenha transitado em julgado na esfera administrativa. O conceito de reincidente é geral, ou seja, basta o cometimento de quaisquer das infrações e não se exige a repetição específica de determinada infração. O valor da UFESP para 1º.01.2011 a 31.12.2011 é de R$ 17,45 (dezessete reais e quarenta e cinco centavos). Assim, estipulada a multa em 100 UFESPs, o valor atual seria de R$ 1.745,00 (mil e setecentos e quarenta e cinco reais).
    Mínimo da multa no caso de falta grave: (1) 200 UFESPs em caso de fornecedor optante do simples; (2) 1.000 UFESPs para fornecedor com receita anual igual ou inferior a 650.000 UFESPs; (3) 2.500 UFESPs em caso de fornecedor com receita superior a 650.000 UFESP.
     Infrações de natureza média. São as dispostas no art. 2º, inciso II (“deixar de utilizar mecanismos que assegurem, no espaço física onde ocorra venda, oferta, fornecimento, entrega ou consumo de bebida alcoólica, a integral observância ao disposto nesta lei”) e artigo, 2º, parágrafo 2º (“deixar de dispor em local ou estande específico, distinto dos demais produtos expostos”).
     O mínimo e  máximo estão estipulados entre 10 e 5.000 UFESPs. Aplica-se em dobro na hipótese de reincidência. Porém o mínimo será de 150 UFESPs no caso de fornecedor optante pelo “simples”, 750 UFESPs para fornecedor com receita burta igual ou inferior a 650.000 UFESPs e 2.000 UFESPs no caso de receita bruta superior a 650.000 UFESPs. Trata-se de um critério muito confuso.
    Infrações de natureza leve. São as dispostas no art. 2º, inciso I (“deixar de afixar avisos da proibição de venda, oferta, fornecimento, entrega e permissão de consumo de bebida alcoólica, ainda que gratuitamente, aos menores de 18 (dezoito) anos, em tamanho e local de ampla visibilidade, com expressa referência a esta lei e ao artigo 243 da Lei federal nº 8.069, de 13 de julho de 1990, constando a seguinte advertência: “A BEBIDA ALCOÓLICA PODE CAUSAR DEPENDÊNCIA QUÍMICA E, EM EXCESSO, PROVOCA GRAVES MALES À SAÚDE.”) e a do artigo 2º, § 1º da referida Lei (“deixar de afixar os avisos de proibição em número suficiente para garantir a visibilidade na totalidade do ambiente conforme regulamentação a ser expedida pelo Poder Executivo”).
      Sanções: A multa fica limita ao mínimo de 100 e no máximo 5.000 UFESPs. A multa mínima será de 100 UFESPs em se tratando de fornecedor do “Simples Nacional”; 500 UFESPs com receita bruta anual igual ou inferior a 650.000 UFESPs; 1.500 UFESPs para fornecedor cuja receita bruta seja superior a 650 UFESPs.
    
  
      Interdição

      Interdição. É a proibição temporária de funcionamento por no máximo trinta dias. Como medida cautelar ou como sanção administrativa limitar-se-á no caso de reincidência (exigindo infração anterior com trânsito em julgado administrativo) e somente nos casos do artigo 1º (venda de bebida alcoólica), artigo 2º, inciso III (permitar o consumo no estabelecimento) e § 3º (deixar de exigir documento oficial), § 4º (deixar de comprovar a idade do consumidor). A reincidência nesse caso é específica e abrange cometer novamente as infrações do art. 1º, do art. 2º, inciso II e §§ 3º ou 4º. É possível contudo que o estabelecimento cometa a infração do art. 1º e depois cometa p. ex. a do art. 2º, inciso II. Nesse caso, será possível
     Se houver descumprimento da interdição ou se houver nova infração após a interdição, deverá o funcionário público oficiar para instauração do processo para cassação da eficácia de inscrição do ICMS.

     Conclusões

     Toda Lei que objetiva coibir o acesso de bebida alcoólica ao menor de 18 (dezoito) anos de idade é bem vinda. Uma das receitas é a utilização do direito administrativo sancionador ao invés do direito penal (tendência moderna). E isto foi utilizado. Há um certo exagero nas punições por falta de explicitação de condutas com um maior detalhamento. Exemplo: o inciso II da referida lei pune aquele que deixe de utilizar mecanismos que assegurem a integral observância do disposto nesta Lei. Existe um subjetividade muito grande e um tipo demais aberto para a punição. Seria a mesma coisa que se falar que se puniria a Polícia Militar por deixar de utilizar mecanismos que assegurem a integral segurança da população. Por outro lado, benéfico que o próprio Poder Executivo estadual se incumba de punir condutas de vender bebida alcoólica (artigo 1º) porque se houver efetiva fiscalização, a máquina estadual é mais eficiente na desestimulação dessa conduta do que a previsão na lei menorista. Veja o caso da proibição de cigarro nos bares e restaurantes. Hoje já é uma realidade. Somente o tempo dirá se a novatio legis gerará efetivos resultados. Vamos aguardar.